quarta-feira, julho 19, 2006

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Uns dias acordamos despidos como que para nascer. Diante nós só temos a luz que penetra, prova aristotélica de que há uma realidade fora de nós. Detrás de nós só falta a coragem para nascer de novo.

Sei que nascer é um erro fatal… e destas vezes pode-se escolher: Erro fatal e humano esse querer nascer.

O erro de nascer é o pecado fundamental.

Escrevo-me um código genético de cada vez que nasço outra vez, apontamento do desapontamento que me espera inevitavelmente no círculo vital: narração exaustiva das frustrações e elenco das tristezas. Para que o corpo saiba intuitivamente que nascer está errado. Cada vez que acordo neste vestíbulo da vida sinto-me mais inquieto como se já me apercebesse. Cheira a equívoco nesta câmara e os lençóis parecem-me manchados de sangue.














[Edward Hopper_A Woman in the Sun]

Este é o silencio assombroso da dúvida: convida-me a luz vespertina. A cama ainda quente oferece-me a segurança que confronta a vontade de sair.



Este é espaço átrio-uterino, o pórtico-vaginal: sente-se na pele o desejo de nascer e o receio de sofrer.
Entrego o corpo à luz fora destas paredes.

Este é o pecado fundamental: nascer para se sofrer e viver sôfrego da esperança de ser mais feliz.

1 comentário:

Ludmila disse...

Estar fechado... seja num cubo (com formas rectas, lógicas e sem riscos desnecessários), dentro de um útero (protegido, quente, amado,...) ou num quarto/cama (isolado... quente... sonanbulo)... Só te faz não viver..

Não sofrer.. é certo... Mas pior do que sofrer.. Não viver..

Bj...