- Sabes P. - digo-lhe - essa coisa de sermos iguais na morte...
- Todos iguais.
- Essa coisa é uma falácia... Andamos todos enganados.
E andamos... todos a pensar que a morte nos toma do mesmo modo.
- Então porquê? - diz P. com o escárnio habitual que reservava para as coisas que eu dizia.
- Não é o morto que experimenta essa mórbida igualdade. Somos nós, aqueles que amamos, que, perante o vazio, nos tornamos todos iguais. É essa lancinante dor de ver partir quem se ama que nos alcança a todos com os mesmos braços num amplexo frio e abismal.
- Quando amamos.
- Quando, realmente, amamos P.
Desta feita, foi com a sua vontade na ponta dos dedos que P. abriu a gaveta e acomodou mais sal em torno do meu coração deposto.
- Para que não se deteriore, que agora é sinónimo dessa outra coisa que o invade inadvertidamente.