Secretamente enfrento o dilema desta noite. Sabendo pouco ou nada sobre o que tu pensas rodeio-me de dúvidas e fujo. Refugio-me na noite e na escuridão só porque não brilho, só porque sou alimento de vergonhas. As sombras apavoram-me, não porque sejam formas ou porque se movam inesperadamente, mas sim porque são indício de luzes indiscretas, curiosas, dessas que me poderiam revelar a ti, ou mesmo mostrar o sangue das minhas dúvidas em ferida aberta. Descamado por achar que te quero cada vez mais, vagueio de carne viva, ardendo contra a aragem da vida, ou pelo próprio caminhar indeciso. Por vezes paro para esconder-me mas a tua imagem persegue-me e pareço encontrar-te sempre à minha frente. Mas sem saber como saber o que sinto, grito para dentro, estalando as minhas veias contra as palavras: “Será isto amor?” E o sangue entope-se-me nestas palavras coagulantes. Nesses tempos não sou mais que sofrimento perdido. Sofrimento de caverna, introvertido e sem reflexos exteriores. São os tempos de máscaras, de mentiras... Em que pareço o simétrico do que sou, o ele que não acredita em amor. O sorriso é a portada que esconde a transparência dos olhos. Esses que não mentem mas disfarçam!
Hoje fingi tocar-te como se isso me pusesse mais perto de ti. Vi sentar-me a teu lado, e vi-te inteira, como se fosses uma collage de momentos, ocasiões, imagens e cheiros. Imaginei tocar-te como se a imagem fosse carne e com uma precisão intensa a minha mão desenhou os teus ombros no ar vazio. E o frio de não tocar-te atacou-me e rechaçou-me de volta à solidão de não ser ao teu lado... sinto que não devo tocar-te e porém desejo-o tanto como o receio. Queria uma catástrofe, que me deixasse sem nada a perder, para que perdendo tudo pudesse arriscar contar-te. Um empurrão invisível para cima de ti, uma certa inevitabilidade num acto de desespero como se me salvasse enquanto tudo arrisco. E parece que espero por esse paradoxo para me revelar. Espero poder perder nada para arriscar perder-te e não me consigo convencer, embora saiba já, que esse momento é não poder ter-te para sempre... Há vezes que me fixo nos teus olhos e penso em dizer-me, mas não são mais que olhos de cobarde com o medo a cobrir a sinceridade. Sempre medrosos os olhos não sabem o que pensar e o coração não sabe o que vê. A angústia tolda e separa sensação do sentimento e instala a confusão no meu corpo. A alma vive divorciada de mim, e tudo o que sente é toldado pelo medo da carne.
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