Cansado, pesado, moído... Morria parado, sem movimento algum e de tão inanimado parecia até já morto... Moribundo era um homem sozinho, morreram todos antes dele e todos sem excepção, longe dele, fisicamente distantes, emocionalmente ainda mais além. A pouco e pouco este fora sendo um homem que fizera da vida a coerência do desistir, construira dos seus dias, das suas horas de existência um verdadeiro monumento à descrença. Aceitava dogmaticamente para poder viver nesta fé descrente o paradoxo de acreditar apenas na demissão da crença e na desistência e fazia do não agir a sua maior acção. Pensava assim poder não ser responsável por nada de mal, ignorando devagarinho e desonestamente não ser responsável por nada de bom...
A sua esfera de influências tinha uma força gravítica nula, ou dizia que sim, mas antes seria de uma polaridade contrária, pois dedicava-se não poucas vezes a fazer perceber às ocasionais colisões com outras pessoas que não as queria e que a sua distância era directamente proporcional ao seu conforto emocional.
Essencial foi também aprender a não acreditar, incutir racionalmente um mecanismo infalível de demolição de uma estrutura inata ao homem. A necessidade de acreditar, a capacidade de, apesar da percepção da ínfima possibilidade, do mínimo potencial, imaginar que pode acontecer, acreditar que se pode…
E assim reduziu a sua capacidade operativa e de acção, nem agia para si nem agia dentro de si, esqueceu-se de sonhar e agora fecha os olhos para morrer, com a certeza que não verá nada na escuridão do sentido real fechado. Tinha a possibilidade de estar em zero. Fora dos sentidos, fora do real, simplesmente não era nada.
Julgava admirar a natureza e a terra porque era tranquila e calma e acima de tudo porque pensava que a natureza simplesmente se deixava estar. Grande equivoco… Não sabe que a natureza se faz de acção, de dinamismo, de perpétuo movimento e que o aparente equilíbrio é fruto laborioso de uma infinidade forças activas que infelizmente nem sabemos por onde começar a compreender.
Conseguira também alcançar um verdadeiro estado de surdez intelectual e emocional. Todas as sensações atravessavam-no como se não existisse. Como se o seu corpo ocupasse quase espaço nenhum, como se conseguisse arranjar um espaço tão grande entre os átomos que o formavam que toda a realidade passava entre ele, sem deixar prova alguma. Como a ridícula brisa que não faz mexer a mais leve erva. Patética brisa que é tão pouco que não chega a existir.
Eliminava quotidianamente aquilo que dizia ser a complexidade da informação do mundo real, e na sua cabeça montava um mundo mais simples de viver, mais fácil de aceitar, um universo ordenado onde tudo era asséptico e perfeito.
Mas como podia segurar este discurso em que brincar a Deus de um mundo mental é simples?
Mais uma vez os erros do seu pensamento eram despejados num esgoto de esquecimento.
Esvaziou-se até morrer só, infeliz e sem deixar saudade.
Sem comentários:
Enviar um comentário