terça-feira, dezembro 01, 2009

O senhor P. arrumou as páginas todas escritas num monte meticuloso... Estava escrita a sua biografia!

O título só podia ser tão óbvio como a vida que acabara de escrever: "Cronofagia"

E assim, tacitamente, o senhor P. acusou, como sempre fazia, a ditadura do tempo de tudo o que ele não foi.

Era difícil perdoar o tempo: mas mais difícil era perdoar-se a si...
Antes de se levantar e apagar a luz sobre a mesa só pôde murmurar: Autofagia, senhor P., Autofagia...

Mas como todo o animal que se preze se sente impelido à sobrevivência, Cronofagia manteve-se inalterado e perpetuou-se a mentira redentora do Senhor P., em tinta sobre papel.

2 comentários:

Anónimo disse...

Este é um dos mais espectaculares que já escreveste.

Também sinto muitas vezes esta nossa tendência para a autofagia e para depois se acabar por culpabilizar o tempo.

O que passou e o que não deveria ter passado e achar que, de vez em quando, o tempo bem que poderia voltar atrás...

Bjs,

M.

Sun Iou Miou disse...

Tentamos devorar o tempo e o tempo o que nos devora. No final, nem sequer resta de nós o que escrevemos: resta só o que os outros lêem.